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O Cordão Infinito (The Infinite Cord)
O Cordão Infinito (The Infinite Cord)
O Cordão Infinito (The Infinite Cord)
Ebook632 pages8 hours

O Cordão Infinito (The Infinite Cord)

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About this ebook

This is a bilingual book (English/ Portuguese)

The Infinite Cord is a bilingual inspirational memoir about the simple life of a Brazilian family on a coffee farm. The stories were stitched to celebrate the 80th birthday of a matriarch. The memories include happiness, humor, suffering, resilience, and other moments of being human. The narratives may help you to look inside and change your life perception. Family and friends make us who we are; the infinite cord connects past, present, and future. Let´s dive in this authentic readings sewed by hand.

 

Este é um livro bilíngue (Inglês/ Português)

Sobre o Livro
O Cordão Infinito é um livro de memórias inspirador bilíngue que descreve a vida simples de uma família brasileira em uma fazenda de café. As histórias foram alinhavadas para comemorar os 80 anos de uma matriarca. As memórias incluem a felicidade, o humor, o sofrimento, a resiliência e outros momentos que relacionam-se ao ser humano. As narrativas podem te ajudar a refletir e mudar a sua percepção de vida. Família e amigos fazem de nós o que somos; o cordão infinito conecta passado, presente e futuro. Mergulhemos nestas autênticas leituras costuradas à mão.

LanguageEnglish
PublisherBalboa Press
Release dateAug 6, 2023
ISBN9798765239377
O Cordão Infinito (The Infinite Cord)
Author

Fabiana Cristina Pimenta

Fabiana Pimenta is from Brazil, spent her childhood in a coffee farm, and moved to USA in 2007. She is a public health Microbiologist, Ph.D., working in a laboratory. She is a passionate learner keeping a beginner’s mind. She has different and unique tastes, going from riding a motorcycle, gardening, teaching Yoga, and writing. She trusts that family and friends make us who we are, and we are all connected by an infinite cord. She wrote stories that include happiness, humor, suffering, resilience, and other moments related to being a human. She says that her life is a daily victory based on hard work and supported by her family and friends’ fabric. She learned that there are endless possibilities, and they are available to all of us, including a barefoot child. Sobre a autora Fabiana Pimenta nasceu no Brasil, passou a infância em uma fazenda de café e se mudou para os EUA em 2007. Ela é microbiologista com foco em saúde pública, Ph.D., e trabalha em um laboratório. Ela é uma eterna aprendiz e tem uma mente de iniciante. Ela tem gostos diferentes e únicos, indo de andar de motocicleta, jardinagem, ensino de Yoga e escrita. Ela acredita que a família e os amigos fazem de nós o que somos, e estamos conectados por um cordão infinito. Ela escreveu histórias que incluem felicidade, humor, sofrimento, resiliência e outros momentos que, afinal, relacionam-se ao ser humano. Ela diz que sua vida é uma vitória diária baseada no trabalho dedicado, e apoiada pelo estofo da família e amigos. Ela aprendeu que existem infinitas possibilidades, e elas estão disponíveis para todos nós, incluindo uma criança descalça.

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    O Cordão Infinito (The Infinite Cord) - Fabiana Cristina Pimenta

    Copyright © 2023 Fabiana Cristina Pimenta.

    All rights reserved. No part of this book may be used or reproduced by any means,

    graphic, electronic, or mechanical, including photocopying, recording, taping or by

    any information storage retrieval system without the written permission of the author

    except in the case of brief quotations embodied in critical articles and reviews.

    Balboa Press

    A Division of Hay House

    1663 Liberty Drive

    Bloomington, IN 47403

    www.balboapress.com

    844-682-1282

    Because of the dynamic nature of the Internet, any web addresses or links contained in

    this book may have changed since publication and may no longer be valid. The views

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    The author of this book does not dispense medical advice or prescribe the use of any

    technique as a form of treatment for physical, emotional, or medical problems without the

    advice of a physician, either directly or indirectly. The intent of the author is only to offer

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    being. In the event you use any of the information in this book for yourself, which is your

    constitutional right, the author and the publisher assume no responsibility for your actions.

    Any people depicted in stock imagery provided by Getty Images are models,

    and such images are being used for illustrative purposes only.

    Certain stock imagery © Getty Images.

    ISBN: 979-8-7652-3936-0 (sc)

    ISBN: 979-8-7652-3938-4 (hc)

    ISBN: 979-8-7652-3937-7 (e)

    Library of Congress Control Number: 2023903203

    Balboa Press rev. date: 07/25/2023

    Esse livro é dedicado a minha mãe.

    CONTEÚDO

    Colaboradores – ordem alfabética

    Prefácio

    Quanto caminha uma criança descalça?

    Qual é a minha intenção com essas histórias?

    Fios de barriga

    Maria tem fé na vida

    Maria, a irmã mais velha

    Maria, a irmã do meio

    Maria, a irmã mais nova

    Pai e Pais

    O que você sabe sobre os seus ancestrais?

    Fio de família. O que é isso?

    Árvore genealógica em prosa

    Linha Materna

    Não vamos desperdiçar a festa; teremos um casamento!

    Definindo a família

    De onde vem o seu sobrenome

    Padrões familiares

    Vamos nos vestir, e sair

    Calças por baixo das saias

    A segunda pele

    O vestido dos sonhos

    Descobrindo

    Vamos brincar?

    Você está ocupada?

    Oferecendo ajuda

    Mineiro nunca perde o trem

    Ele consertaria. Ah, consertaria!

    A casa antiga da fazenda

    A jabuticaba floresce em árvores mágicas

    O pó dourado

    Comunidade dos Pimentas

    Lágrimas azuis

    Festa Junina

    Congada e Folia de Reis

    Bênção e aperto de mão

    A comida cultivada em casa

    Criando sua própria comida

    Como não amar animais de estimação?

    O humor entre família e amigos

    Truques de minha mãe e seus irmãos

    Brincadeira de criança em dia chuvoso

    A ingenuidade de meu pai e seus irmãos

    Meu pai e o tatu

    Os dentes afiados de Flaviana

    Estrume e espinho

    Controle de formigas

    Começa o jogo de futebol!

    Selecionando os jogadores do time

    Avô, treinador e árbitro

    O jogo da vida continua

    O fogo queimou o meu tênis de futebol

    Não quero mudar

    Em algum lugar no passado

    Pão de Queijo

    A amizade começou na piscina

    A primeira vez na praia

    Costurada na nossa família

    Um gesto que nunca será esquecido

    Pescar: o passatempo favorito de meu pai

    Companheiro de pesca

    O que você gosta de comemorar?

    A casa da vó Mercedes

    Celebração com final triste

    Os 70 anos de Joaquim

    Os 70 anos de Maria de Lourdes

    Sonho de Valsa

    Chá de bebê

    Uma mãe aventureira!

    Quando será a próxima aventura?

    Só rindo mesmo

    Quem é uma grande influência em sua vida?

    O passado ficou para trás

    Por que é tão difícil pedir ajuda?

    A confiança quebra o medo

    O que importa afinal?

    Enfie a linha na agulha

    Mãe, qual é o seu segredo?

    Respiração

    Um homem ousado e carinhoso

    É tão difícil sair de casa e ir para casa!

    Lembre-se sempre, nunca se esqueça!

    Sugiro que você escreva cartas!

    Palavras de gratidão

    Contar histórias é a forma mais antiga de educação.

    _Terry Tempest Williams

    COLABORADORES –

    ORDEM ALFABÉTICA

    Adelina Pimenta Neves Laginestra

    Adalberto da Silva Porto

    Adriano Zumstein

    Ângela Maria de Moura

    Aparecida Teodoro de Souza

    Aufra Araújo

    Beatriz Ruiz Candolo Vilas Bôas de Oliveira

    Bruce Adams

    Caroline Henry

    Cleber Márcio Pimenta Neves

    Daniela Cristina Vilas Bôas

    Daniela Pimenta Neves Laginestra Petri

    Delza Fernanda Pimenta Neves

    Elen Almeida Romão

    Elisandro Vilas Bôas Silva

    Elisangela das Dores de Jesus Geraldo

    Fátima Aparecida Candolo de Oliveira

    Flaviana Regina Pimenta

    Felipe Ruiz Candolo Vilas Bôas de Oliveira

    Gabriela Ruiz Candolo Vilas Bôas de Oliveira

    Gilberto da Silva Porto

    Giovani Rondon

    Heber Erickson Pimenta Neves

    Isabele Beatriz Gripa

    Ivone Pimenta Duarte

    Jane Aparecida Ferreira Gripa

    José Carlos de Paula

    Juliano Pimenta Neves Laginestra

    Leila Lúcia da Costa Barbosa

    Linda Rosa Maria Xavier Porto

    Nishi Patel

    Marcela Neves Bataglião

    Marco Antônio Pimenta

    Maria de Lourdes Vilas Bôas Pimenta

    Maria Helena Vilas Bôas de Paula

    Maria José Vilas Bôas Silva

    Maurício Pimenta Vilas Bôas

    Oscar Henrique Pimenta Vilas Bôas

    Ronaldo Donizetti de Oliveira

    Sarah Trammel

    Sílvio César Ferreira

    Cleci Leão – revisora e preparadora da versão em Português

    PREFÁCIO

    Tome sua agulha, meu filho, e trabalhe em seu ritmo; dele, uma rosa vai surgir pouco a pouco. A vida é assim: um ponto de cada vez, aplicado com paciência, e o padrão vai saindo bem feito. _O Anjo da Guarda, Oliver Wendell Holmes

    Conheci Fabiana em um curso online de redação em junho de 2021. Quase imediatamente, senti uma conexão com ela, mesmo apesar das distâncias, reais e figurativas, colocadas entre todos nós durante esses anos da pandemia. Fabiana foi calorosa, honesta e rápida no sorriso, e logo os outros alunos da turma, seguindo a sua liderança, começavam a se abrir e compartilhar mais de si próprios.

    Fabiana tem a capacidade de fazer conexões fáceis com todos que conhece; e depois de ler as histórias de sua família, comecei a entender o porquê. E é justamente a família de Fabiana.

    Neste livro, você encontrará as histórias de uma família brasileira ao longo do século passado, cuidadosamente agrupada para celebrar o aniversário de 80 anos de uma amada matriarca. Essas histórias são uma coleção de momentos, alegres e trágicos, que nos trazem a imagem clara e honesta de uma família, vivendo, amando, crescendo, trabalhando, dançando, cozinhando e criando. Uma família que teve, nos seus pontos baixos, os fios sendo amarrados com mais profundidade, mas você verá que foram pontos tecidos com cuidado e paciência. E então você vai reconhecer as inconfundíveis rosas brilhantes e bonitas que vieram como resultado.

    Se você, leitor, é um membro da família, ou amigo de Fabiana, cuja própria trajetória não tem semelhança alguma com essa família no Brasil rural, vai sentir essas histórias profundamente. Famílias fazem de nós o que somos, o que temos de bom e mau, de desapontador ou de bonito a ponto de doer. É em nossos momentos mais felizes que acabamos sentindo falta de nossos entes queridos perdidos, e é em nossos piores dias que sentimos o aprofundar das conexões, o crescer dos afetos.

    Nossas famílias, sejam dadas ou escolhidas, são quem nos concede os parâmetros e a paciência que vão nos guiar ao longo do caminho. Como no tear: um ponto de cada vez. Juntos, aprendemos que, aos poucos, uma rosa vai surgir.

    Caroline Henry.

    22 de setembro de 2022.

    Atlanta, Georgia.

    QUANTO CAMINHA UMA

    CRIANÇA DESCALÇA?

    Sou brasileira, e morei na roça até os 14 anos de idade. Passei a maior parte da infância descalça, brincando com minha irmã Flaviana Regina Pimenta. Minha mãe, Maria de Lourdes Vilas Bôas Pimenta e meu falecido pai, Joaquim Porto Pimenta, tiveram muito pouco acesso a educação formal, mas desenvolveram uma profunda sabedoria de vida.

    Lembro-me do presente que ganhei de aniversário ao completar 4 anos. Meus pais me deram um quadro-negro e giz. Foram eles que me ensinaram a ler e escrever e, aos 4 anos de idade, adorava mostrar minhas habilidades de escrita e leitura. Quando criança, um dos meus vários sonhos era falar línguas e ler livros.

    Meus pais trabalharam arduamente para manter a casa e nos encaminhar para a faculdade. Minha mãe é costureira, e meu pai era agricultor e motorista. Às vezes, ele bebia um pouco a mais, o que era difícil para nossa família em termos emocionais e financeiros.

    Comecei a usar sapatos para ir à escola, o que eu odiava! Eram chamados de conga, um tipo de tênis feitos de lona. Eram desconfortáveis e, depois de um tempo, ficavam apertados. Minha mãe cortava a parte da frente, ou o bico das congas, para garantir mais espaço aos dedos. Frequentei uma escola rural até a terceira série.

    Fui tachada de caipira ou da roça ao mudar para a escola municipal em São Tomas de Aquino, Minas Gerais. Ainda vivíamos na fazenda, e havia alguma discriminação, mas meus pais sempre nos motivaram a continuar. Continue sempre é um dos conselhos mais importantes que recebi ao longo da vida.

    Mudamo-nos para a cidade de Ribeirão Preto, em 1984, para que pudéssemos cursar o ensino médio. Foi difícil, mas ainda consigo ouvir as palavras da minha mãe: "estude, porque é a melhor maneira de obter sucesso".

    Em 1986, me inscrevi, realizei as provas e fui aceita em uma faculdade pública. Foi um dos dias mais felizes da minha vida. Nunca me esquecerei. Era um dia chuvoso. Corri para casa na chuva, para dizer aos meus pais que tinha entrado na faculdade. Foi a vitória do trabalho árduo, e o sacrifício da minha família. No entanto, não havia opção pública para cursar literatura, então decidi ser farmacêutica.

    Naquela época, Flaviana, que conseguira uma bolsa de trabalho no Banco Brasil, ajudou meus pais a pagar as contas. Assim, pude estudar.

    Estava realmente empolgada, e tive aulas de Microbiologia já no primeiro ano da faculdade, em 1987. Adorei aquilo, e comecei a estagiar no laboratório de bacteriologia sob supervisão da Dra. Izabel Yoko Ito. Logo me tornei um rato de laboratório! Dra. Ito transformou a minha vida, e virou não apenas mentora, mas também um membro da família.

    Minha formatura em Farmácia deu-se em 1990 e, no último semestre, mudei-me para São Paulo, para passar por treinamento em um laboratório de renome chamado Instituto Lavoisier. Foi difícil estar em uma nova cidade com pouco dinheiro. Lembro-me de ir para a cama com pouca comida na barriga ou, de barriga vazia, a infame expressão brasileira de estar com fome.

    Depois de 3 meses, consegui um emprego no Lavoisier, mas falhei na primeira tentativa de entrar no programa de Mestrado em Microbiologia. Foi frustrante, mas me preparei um pouco mais e fui aceita no programa no ano seguinte. Finalizei o mestrado em 1995, e me tornei Professora de Microbiologia na Universidade Federal de Goiás. Foi uma conquista fabulosa. Adoro ensinar.

    Em 1999, o Brasil iniciou um programa de vacinação para Haemophilus influenzae b (vacinação Hib), e fui convidada para participar no estudo de portadores dessa bactéria e Streptococcus pneumoniae, para dar apoio laboratorial e avaliar o impacto da vacina. O programa foi lançado em 2000, quando eu estava em curso para o Doutorado. Foi o início da minha jornada na saúde pública, carreira profissional na qual ainda atuo.

    Terminei a tese de Doutorado em 2001. Nossa equipe de laboratório estava trabalhando longas horas, fins de semana inclusive, para apoiar o programa de supervisão. Em meio a tudo isso, resolvi me casar. Porém, não mais do que 18 meses depois, o casamento terminou em divórcio. Fiquei devastada, considerei aquilo um enorme fracasso que até hoje me incomoda por vezes.

    Frustrada, deprimida e sobrecarregada, em 2005, no Dia de São Valentino (Dia dos Namorados nos Estados Unidos), e que é também o dia do meu aniversário, decidi dar a mim mesma um presente: uma assinatura da Sociedade Americana de Microbiologia (ASM). Como membro afiliado, ganhei acesso a muitos artigos científicos da área. Eu estava ficando mais isolada, vivendo no meu mundo só do trabalho.

    Em janeiro de 2006, encontrei um artigo sobre serotipagem de Streptococcus pneumoniae, bactéria também chamada de pneumococo. Fiquei muito animada, e decidi enviar um e-mail para o autor correspondente. Perguntei se havia uma possibilidade de aprender essa técnica. Alguns dias depois, recebi uma resposta dizendo sim. Ele me aceitaria como uma pesquisadora visitante em seu laboratório, no centro de saúde pública de referência mundial em Atlanta, Estados Unidos. No entanto, ele não dispunha de fundos para o programa. Então, candidatei-me a uma bolsa de estudos da ASM, com a qual fui agraciada.

    Meu sonho tornara-se realidade. No dia 11 de novembro de 2007, cheguei à cidade de Atlanta, na Georgia. Planejava passar 4 meses trabalhando em serotipagem pneumocócica. Trabalhei com afinco, e passei muito tempo no laboratório. Na última semana do treinamento, meu supervisor perguntou se eu gostaria de ficar ali por mais dois anos, com uma bolsa durante aquele período.

    Fiquei surpresa e animada. Liguei para minha mãe para pedir conselhos. Imediatamente, ela respondeu: "eu já sabia que você não iria voltar, siga o seu caminho". Foi uma decisão difícil, mas que eu abracei. Já trabalho neste laboratório há mais de 15 anos, e estou sempre aprendendo e servindo.

    Normalmente, trabalho em projetos internacionais, e minha primeira viagem, em 2008, foi para a Etiópia. Fiquei chocada! Testemunhei uma pobreza brutal, hospitais sem as mínimas condições básicas, tais como suprimento adequado de água ou de energia. Minha história de vida e os desafios da minha família não eram nada quando comparados à enorme falta de assistência, saúde, educação e necessidades primordiais.

    Apresentei parte de minha trajetória pessoal em uma conferência – TED talk – em 2016. TED é um acrônimo que significa Tecnologia, Entretenimento e Design. Fiquei muito orgulhosa, e aquilo fez parte das muitas realizações que tenho na vida pessoal e profissional, sempre apoiada por muitas pessoas, anjos e almas.

    Em 2008, também conheci meu amado Bruce Adams, e ainda estamos juntos. Agradeço o seu apoio durante esta jornada. Fui apresentada à sua família em um jantar de Ação de Graças, e eles foram cordiais. Ajudei-o a criar seus dois filhos, Sophie e Liam Nicholas, que tinham seis e três anos de idade. Eles costumavam vir para a nossa casa todo fim de semana, e gostavam de comer o arroz e feijão brasileiro que eu cozinhava. Ultimamente, eles estão em outra fase da vida, e não nos visitam com tanta frequência. Sinto falta deles, mas sei que isso vai mudar. Os fios da vida mostram que as fases são cíclicas, e eles voltarão para nos visitar com mais frequência.

    Vivo imaginando e esperando que o meu trabalho esteja ajudando vidas, especialmente crianças ao redor do mundo. Visitei e ajudei a treinar pessoas em mais de 15 países. Imaginem, eu, uma criança descalça, que já andou nesses países e todos continentes!

    Como pesquisadora, passo a maior parte do tempo pensando e usando o meu cérebro de forma técnica. Eu tinha o hábito de me exercitar, mas de certa forma, esqueci que tinha um corpo que precisava descansar; e que a minha mente e o meu corpo precisavam de quietude. Eu me acabei (o tão conhecido e atual burnout), e fui diagnosticada com fibromialgia. Embarquei em uma prática diária e consistente de Yoga para superar a dor e o estresse. A Yoga me permite respirar, mantém o meu foco e melhora o bem-estar físico e emocional.

    Vivencio, em primeira mão, os benefícios da prática. Em 2017, recebi a certificação para ser instrutora de Yoga, e continuo meus estudos com diferentes professores e mentores. Hoje, tenho a honra e privilégio de facilitar a prática de Yoga. Eu sou uma eterna aprendiz, tenho uma mente de iniciante, e também estou descobrindo o movimento somático. Estou empenhada em tornar a prática de Yoga acessível a todos. Sou grata a todos os amigos da Comunidade de Yoga.

    Tendo o inglês como segunda língua, estou sempre tentando aprender e melhorar. Não descarto uma oportunidade de fazer um curso, já que um dos meus sonhos de criança era ser poliglota. Em 2021, tive a oportunidade de fazer um curso de redação, e conheci duas professoras brilhantes - Julia Weidmann e Caroline Henry. Elas me inspiraram e motivaram a buscar mais um de meus sonhos de infância, que era escrever um livro. Como amante de livros, estou sempre lendo, e ainda prefiro a cópia em papel.

    Foi assim que comecei a escrever essas histórias sobre a nossa família. Minha intenção era homenagear minha mãe e comemorar seu aniversário de 80 anos. No entanto, este projeto transformou-se em uma enorme narrativa: uma colcha de retalhos tecida por vários colaboradores que entrelaçam os fios de alegria, tristezas, e resiliência de nossa família.

    Minha vida é uma vitória diária baseada no trabalho dedicado, e apoiada pelo estofo de minha família e amigos, como você vai notar ao ler essas histórias. Dedico-me sinceramente a todos os seres humanos e criaturas. A criança descalça que já fui nunca teria acreditado ser capaz de caminhar tão longe. Aprendi que existem infinitas possibilidades, e que elas estão disponíveis para todos nós. Qualquer um, incluindo uma criança descalça, pode andar muito longe. E sempre seguiremos, amarrados ao cordão infinito.

    QUAL É A MINHA INTENÇÃO

    COM ESSAS HISTÓRIAS?

    Com este livro de histórias, desejo oferecer aos familiares e amigos memórias costuradas para honrar a amizade, os nossos ancestrais, além de celebrar o aniversário de 80 anos de uma mulher que nunca para de trabalhar, servir e costurar.

    É uma coleção de eventos vividos e capturados livremente por minhas próprias lentes, assim como de uma série de colaboradores. Entre as histórias, despontam a felicidade, o humor, o sofrimento, a dor, a resiliência e muitos outros momentos que, afinal, relacionam-se ao ser humano. Revelam a elasticidade e coragem de minha mãe, pai, irmã, tias, tios, primos e outros membros da família, ancestrais, amigos, estranhos e anjos.

    As histórias descrevem as tradições familiares, a vida simples em uma fazenda de café no Brasil, e a vida na cidade. Elas também mostram nossa relação com a natureza e a comida, celebrações, devoção e reuniões para a oração, em eventos reunidos e costurados para que mantivéssemos essas preciosas memórias.

    As narrativas têm por intenção evocar a conexão infinita do cordão de ser humano: perguntas, respostas, sugestões e algumas soluções. Convido o leitor a refletir sobre cada evento e descobrir o seu fio perfeito, tendo em mente a definição de Santa Teresa de Lisieux: "perfeição é, na realidade, a nossa capacidade de incluir, perdoar e aceitar a imperfeição".

    A contação de histórias está alinhavada no tecido da vida de minha mãe, Maria de Lourdes, e meu pai, Joaquim. É como se usássemos um cordão infinito para conectar as pessoas, costurando, tricotando, remendando e bordando tecidos na colcha sagrada da família. Cada fio de sua trajetória foi costurado com simplicidade, bondade, trabalho árduo, sacrifícios, vontade de ser feliz e de estar em paz.

    As histórias abordam a beleza e a imperfeição de sermos humanos, o universo diversificado do sofrimento, das alegrias e das pequenas vitórias diárias.

    Meu pai como motorista conduziu muitas pessoas ao seu destino. Ele adorava cultivar sementes e de pescaria. Ele era uma pessoa quieta e queria para a sua vida apenas a barriga cheia de boa comida, uma casa para morar com uma cama para dormir sem preocupações e em paz.

    Você pode ler este livro de ponta a ponta, mas a minha recomendação é que não se apresse; ou que faça uma pausa, respire, ou abra aleatoriamente em qualquer página. Conecte-se ao teor do ponto em que abriu, leia, saboreie a história e imagine as emoções, sentimentos e quem sabe poderá encontrar a si mesmo em algum lugar no tempo.

    Espero inclusive que as histórias lhe tragam uma conexão com suas próprias memórias de família, que nos remetem à beleza, à dor, à resiliência e às vitórias do viver. Faça uma visita à história da sua família, honrando o seu cordão infinito.

    Cada história, frase e palavra foi escolhida com o coração aberto e sem intenção de prejudicar qualquer pessoa, mas sim compartilhar nossas memórias. Ainda assim, elas inevitavelmente carregam o viés da interpretação individual.

    Você poderá encontrar uma história que o inspire, e assim costurar esse pedacinho como inspiração para a sua própria jornada. Enfiar a linha na agulha. Chorar, ficar com raiva, rir, divertir-se muito, ou simplesmente compreender. Obrigada, e tenha uma ótima leitura!

    FIOS DE BARRIGA

    Olhe para o seu abdômen! Sim, a parte do nosso corpo entre o peito e a pélvis, a barriga.

    Olhe para esse buraco no meio da sua barriga. Seu umbigo é único. Ele é exclusivo de cada indivíduo, pelo simples fato de ser uma cicatriz. Clinicamente, ele é conhecido como umbilicus, uma área é saliente, plana ou oca bem no centro do nosso abdômen. É o local de fixação do cordão umbilical, o cordão infinito.

    Olhe de novo para sua barriga. Se você é como eu, talvez não tenha grande apreço por essa parte do corpo, pensando que ela talvez pudesse ser um pouco menor, ou mais exercitada. Uma reflexão desse tipo pode nos inspirar a adotar um estilo de vida melhor, uma dieta mais saudável e uma rotina de exercícios mais consistente.

    Ao longo dos anos, mudei minha percepção e desenvolvi o tal do apreço por barrigas, não aquelas cheias de gordura ou de cerveja, mas aquela em que imagino estar ainda dentro do ventre da minha mãe. Essa prática nasceu de uma atividade orientada por Isadora Canto, uma cantora brasileira e mentora para empoderar mulheres. Ela interpreta uma canção chamada Plantadeira, escrita por Minuska, cuja a letra diz "eu vim do corpo da minha mãe. Ela me deu semente boa. Nutre meu corpo, se espalhe bênçãos. Sou plantadeira de semente boa".

    Quando fiz a prática, me senti aquecida, segura e amada. Não é todo mundo que absorve essa experiência como algo agradável, especialmente quem não sabe, ou não tem uma conexão assim tão forte com a mãe. No entanto, confesso que a prática me trouxe uma visão brilhante sobre mim mesma. Instigou a curiosidade que me levou a explorar mais sobre a linhagem da minha família.

    Independentemente de como você percebe sua barriga, eu gostaria de convidá-lo a explorar sua relação com o umbigo. No corpo adulto, ele fica bem no meio da barriga, é o nosso centro, e um lembrete inquestionável de que, a certo ponto da vida, fomos alimentados através do cordão umbilical, uma ligação infinita e vital com a nossa mãe. Que conexão maravilhosa temos com as nossas mães! O cordão infinito, a conexão com a mãe e com os ancestrais é eterna.

    Convido você agora a imaginar-se dentro da barriga de sua avó. Você pode imaginar isso?

    Sim, imagine-se dentro da barriga de sua mãe, dentro do ventre de sua avó! Pode parecer enrolado e dar um nó, mas tente. Isso me lembra uma expressão que a minha mãe sempre usa quando está tentando entender coisas complexas: "está dando nó no meu cérebro".

    Deixe-me explicar: nossa célula original, o óvulo de nossa mãe, foi formado dentro do corpo dela, quando ela estava dentro do útero de nossa avó. De fato, em algum lugar no tempo, estivemos dentro da barriga de nossa avó! E depois de vários anos, talvez 27 ou 30 anos, a célula presente em nossa mãe amadurece no ovário, dando origem ao embrião depois de se fundir ao espermatozoide de nosso pai. Esta fusão celular inicia nosso corpo primordial, que é alimentado através do cordão umbilical. Esse cordão contém duas artérias umbilicais e uma veia umbilical, através da qual o coração fetal bomba sangue da placenta, e para ela, ocorrendo a troca de nutrientes e resíduos com o sistema circulatório da mãe. As células vão se dividir, multiplicar, diferenciar-se e, por fim, formar o nosso corpo, com trilhões de células.

    Não tive a oportunidade de conhecer minha avó materna, Dionésia Pimenta de Lima. Ela morreu quando minha mãe tinha 22 anos. Como minha mãe não tinha uma relação próxima com ela, nunca compartilhou comigo muitas histórias sobre minha avó, o que me fez não apenas alheia aos fatos sobre ela, mas também pouco curiosa a respeito. No entanto, depois de fazer o tal exercício da barriga, dentro do útero, dentro da barriga, percebi o nosso fio - e nossa estreita conexão. Obrigada, avó Dionésia, pelo dom da vida.

    Muito do meu corpo, identidade e comportamento tem por molde os meus ancestrais, embora costurado no tecido de minha mãe. A distância, e, no meu caso, a vida em outro país, não rompe o cordão infinito. Estamos unidas de uma forma mágica que é impossível de explicar. Conversamos todos os dias, graças ao WhatsApp. As conversas são curtas, e não precisamos de muitas palavras para expressar o que está acontecendo. Como li uma vez, vivemos perto como os dedos dos pés, temos as mesmas raízes. Ela não é só mãe. Maria de Lourdes Vilas Bôas Pimenta é minha melhor apoiadora e motivadora, sempre muito mais confiante, até mesmo do que eu jamais fui, de que posso superar desafios.

    Quando estou em uma situação em que não sei o que fazer, enroscada em meus pensamentos, costumo chamá-la com um pedido de orações. Não preciso explicar o que está acontecendo, ela já sabe. Quando atende o telefone, já vai dizendo: "sente-se, concentre-se, fique calma, e eu rezarei para você". Ao ouvir sua voz, meu coração fica mais leve e a situação parece menos difícil. Ela vai me abençoar antes de desligar o telefone. Minha mãe, minha irmã e eu rezamos juntas pelo menos uma vez por semana, um ritual para agradecer e pedir bênçãos.

    Conheço os ciclos de vida, mas é muito difícil imaginar o que farei sem as suas orações e sabedoria nesta dimensão. Obrigada por ser minha guia, exemplo de resiliência, compaixão e a melhor mãe. Obrigada, mãe, pela vida!

    Percebi que a conexão com nossos ancestrais é incrível: há um cordão infinito que une todos nós. Se voltarmos à célula da nossa avó, que formou a nossa mãe, refletimos que um dia ele, por sua vez, estava dentro da sua mãe, que era a nossa bisavó. Isso pode dar um nó no cérebro, mas, de certa forma, estamos ligados por um emaranhado de fios de barriga. Talvez você possa imaginar esse lindo ciclo da nossa jornada dentro de vários úteros, ou pelo menos o fio da barriga de nossa mãe e avó.

    Enfim, cuide da sua barriga. Adote hábitos saudáveis para a barriga, conecte-se com ela e ouça sua a intuição.

    MARIA TEM FÉ NA VIDA

    Maria de Lourdes. Maria José. Maria Helena. Todas, Marias. São três as irmãs – como as estrelas, Três Marias. E, assim como Maria de Nazaré, elas têm fé.

    Maria de Lourdes é a mais velha, Maria José é a do meio e Maria Helena, a mais nova.

    Maria garota. Maria filha e irmã. Maria é uma mulher forte. Amiga e esposa, Maria é mãe, tia, prima, avó, bisavó, esposa e parceira amada. Ela é linda e gentil. Maria é uma guerreira curiosa e inteligente. Maria é total.

    A Maria entoada na música de Milton Nascimento é uma mistura de dor e alegria. Maria tem graça, sonhos e cicatrizes de vida, mas ela ainda tem fé na vida.

    Todas as Marias têm fé na vida, e mantêm a teia infinita, numa mistura de força e delicadeza.

    Maria é a dona da fazenda e da casa da cidade, planta alimentos, flores e rosas. Ela é a guardiã do jardim. Cuida das rosas, espinhos e brotos. Cultiva a sua própria comida, alimenta a família e os amigos. Cuida das galinhas e recolhe os ovos. É ela quem alimenta os gatos e os pássaros. Às vezes, também cuida dos porcos, gado e cavalos. Maria não apenas trata dos cachorros, mas conversa com eles.

    Tal como Maria Bonita, a histórica guerreira brasileira, ela acorda, sai da cama, acende o fogo e prepara o café. Sai para buscar o leite, e eventualmente faz o queijo. Maria prepara as refeições, bolos, doces e tantas outras comidas deliciosas. Pequenas coisas que tornam a vida agradável.

    Maria tem tantas habilidades!

    A habilidade manual das três Marias é impressionante. Além de todas as tarefas caseiras da casa e da roça, elas sabem costurar, tricotar, fazer crochê e bordados. Suas mãos criam peças de imensa beleza com muita gentileza e precisão.

    Você sabe costurar, tricotar ou bordar? Já tentou? Aprendeu habilidades manuais com algum membro da sua família? É realmente uma maneira de unir as gerações da vida, manter o cordão infinito. Tenho certeza de que você também tem alguma habilidade que poderia ser ensinada a alguém. Pode ser divertido, e ensinar uma habilidade criará um fio de memórias preciosas.

    Com seu talento extraordinário, as três Marias costuraram milhares de metros de linha, conectaram retalhos e criaram o enorme tecido que é a colcha sagrada da família. Honro minhas três amadas Marias, e todas Marias por manterem a linha do cordão infinito.

    Maria tem mãos que oferecem, recebem, empurram e puxam.

    Maria tem mãos que servem, rezam, curam e machucam.

    Maria tem mãos e braços que protegem, abraçam, seguram e libertam.

    Maria nunca para, não se acomoda. Ela parece incansável, mas, Maria, você deve descansar! Por favor, descanse e aceite ajuda. Você já trabalhou demais.

    Maria, você é abençoada! Você tem fé na vida!

    Maria, peço suas bênçãos!

    Obrigada, Maria!

    Eu sou aquela mulher a quem o tempo muito ensinou. Ensinou a amar a vida e não desistir da luta, recomeçar na derrota, renunciar as palavras e pensamentos negativos. Acreditar nos valores humanos e ser otimista. _Cora Coralina

    MARIA, A IRMÃ MAIS VELHA

    Maria de Lourdes Vilas Bôas, de apelido DeLu, a quem também chamam Lourdes. Ela é a mais velha das três Marias, e sua paixão é costurar. Casou-se com Joaquim Porto Pimenta e teve duas filhas, minha irmã e eu. Sempre costurou, e às vezes faz crochê, ofício que aprendeu quando tinha 12 anos, ensinada por uma tia.

    Mãe, o que a Senhora está fazendo? – eu sempre pergunto quando ligo. E toda vez que ela responde Estou costurando! – e ainda repete: Estou costurando! –, há um pouco de sarcasmo e outro tanto de humor na resposta, afinal eu deveria saber o que ela está fazendo, já que está sempre costurando.

    Perguntei certa vez quantas peças de roupa ela achava que já havia costurado. E, sem pensar ela respondeu: se você as pendurar em um varal, uma por uma, lado a lado, vai ligar a cidade de Ribeirão Preto a Atlanta, onde você mora.

    Uau, não esperava essa resposta! Perguntei de novo, mas ela repetiu o que tinha dito antes. Fiquei realmente espantada porque nunca teria pensado numa resposta dessas. Minha mãe tem uma imaginação muito surpreendente e única.

    Como sou curiosa, verifiquei a distância real entre essas duas cidades: são 4.475 milhas, ou 7.202 quilômetros entre Ribeirão Preto, a cidade onde minha mãe mora, e Atlanta, na Georgia, onde moro. Aquilo me levou a imaginar todas as roupas costuradas por minha mãe, penduradas em um enorme varal ligando a América do Sul à América do Norte. Seriam milhares e milhares de roupas penduradas. Tenho certeza de que ela costurou milhares de calças, vestidos, saias e tantas outras roupas, mas elas certamente não ligariam as duas cidades.

    Essa conversa surreal me trouxe à mente a literatura de cordel, a qual significa, em seu sentido mais literal, a literatura em cordas, típica do Nordeste do Brasil. Folhetos impressos ou panfletos contendo romances folclóricos, poemas e canções que são pendurados em barbantes para serem exibidos a potenciais clientes em mercados de rua. Talvez, se minha mãe pudesse recuperar todas as roupas que costurou, e as pendurasse para vender, ganharia um dinheirão, ou quem sabe poderia vestir quase toda a população carente que vive nas ruas.

    Adorei o comentário que Caroline Henry escreveu quando editava essa história, e decidi acrescentá-lo. Ela disse que a minha mãe tem uma mente incrível, e obviamente se sente profundamente ligada a mim. Talvez ela imagine a sua costura, e as roupas no varal, para ficar ligada a mim. Talvez isso seja verdade.

    Como você se conecta com seus entes queridos?

    MARIA, A IRMÃ DO MEIO

    Maria José Vilas Bôas Silva, a irmã do meio, que também chamamos de José, casou-se com Waldir Aniceto da Silva, com quem teve dois filhos: Elisandro e Dayana Vilas Bôas Silva.

    Ela também é costureira, mas mudou para tricô e crochê quando teve seu o primeiro filho. Elisandro, meu primo, adoecia com frequência, e ela tinha que cuidar do bebê. Então foi difícil continuar costurando, e o crochê lhe pareceu uma alternativa melhor. O crochê era um pouco mais fácil porque eu podia fazer e manter um pé no carrinho do bebê, balançando-o. Tinha que balançá-lo continuamente, porque ele chorava muito, então não conseguia usar a máquina de costura - disse-me ela certa vez, o que me fez lembrar de um ditado segundo o qual o trabalho de uma mulher nunca se acaba.

    Maria José aprendeu o crochê com sua mãe, Dionésia – minha avó. Tornou-se uma exímia crocheteira, e muito do que aprendeu foi por conta própria, através de revistas. Mas ela confessou que mudar da costura para crochê não foi fácil. As pessoas não sabiam que ela tinha essa habilidade, então não tinha clientes.

    Tive que sair batendo de porta em porta no bairro para tentar vender o meu trabalho. As pessoas começaram a conhecer o meu crochê, e espalhar a notícia para algumas senhoras de alta classe. Finalmente, ela conseguiu angariar bastante trabalho, e então pode transformar centenas de metros de fios de algodão em incríveis toalhas de mesa, vestidos, blusas e outras peças.

    Com o passar do tempo, tia Maria José e família mudaram-se para Franca. Mais uma vez, ela teve que encontrar novos clientes. Em seguida, teve outra filha, Dayana. Um dia, levou o bebê a uma consulta médica, e fazia crochê na sala de espera quando começou a conversar com outra senhora que também esperava ali. Foi seu dia de sorte: impressionada com seu trabalho, a mulher passou então a apresentar-lhe vários clientes.

    Pois estava certa a nova amiga: seu crochê é único e perfeito, uma obra-prima. Fico sempre também impressionada com a qualidade, e com os detalhes. José gosta de trabalhar com um fio muito fino. Os pontos têm excelente definição, e a fibra é transformada em flores, folhas ou qualquer outra forma que o cliente desejar. Seus trabalhos de crochê são minuciosos, demorados, e requerem muita atenção. E ela, paciente e persistente em sua atividade.

    Durante nossa conversa, perguntei à tia Maria José se ainda fazia crochê, ao que ela respondeu: Meus olhos estão fracos, e eu realmente não consigo enxergar bem os fios e a agulha, então eu só faço pequenas peças. Em seguida, fez uma pausa e afirmou: Você sabe, esta geração de jovens não aprecia o trabalho de crochê. Eles não valorizam o trabalho feito à mão. Não gostam de enfeitar os móveis. Concordei com ela, e me enredei naquele sentimento incrivelmente nostálgico. Lembrei-lhe, porém, que certamente ainda há pessoas que apreciam e valorizam seu trabalho, além do fato de que a produção artesanal está voltando à tendência.

    Tenho várias peças do seu crochê expostas em minha casa e trabalho, e sinto que é sempre bom tê-las ali para apreciar. Imediatamente, sinto-me conectada a minha tia José.

    Tia Maria José é minha madrinha, e fizemos questão de repetir o padrão - outra versão do cordão infinito: sou a madrinha de sua filha Dayana. Por sua vez, apesar de não ser minha afilhada, a Ísis, filha da Dayana, me chama também de madrinha, e ambas carinhosamente pedem minha bênção toda vez que nos encontramos. É de encher o coração.

    MARIA, A IRMÃ MAIS NOVA

    Maria Helena é a mais nova das três Marias, que também atende por Helena. Casada com José Carlos de Paula, teve dois filhos, Carlos José e Claudinei de Paula. A caçula nunca gostou de costurar, mas também se dedica ao crochê e bordado. Assim como o trabalho de Maria José, seu crochê é único e maravilhoso, uma obra de arte. Ela ainda mora na roça, e há muito trabalho extra para fazer quando se mora em uma fazenda.

    Tia Maria Helena começa sua rotina diária bem cedo, todas as manhãs. Prepara o café, cuida de vários animais, tanto de estimação quanto da fazenda, e faz queijos. Ela adora cozinhar, especialmente para o marido, filhos e netos. Extremamente dedicada à família, confidenciou que, ao ver os filhos doentes, sempre pensava que aquilo poderia ser com ela: Prefiro ficar doente a vê-los passar por isso.

    Ela valoriza o estar junto e, apesar das diferenças familiares, diz que adoraria ser lembrada pelos filhos com a frase: minha mãe fez tudo o que podia para nos ajudar e nos criar. Disso sou testemunha: Helena faz tudo, não só para os filhos, mas para a nossa família. Às vezes, quando criança, minha irmã e eu costumávamos passar a noite na casa dela para brincar com nossos primos ou ir para a escola.

    Todas as manhãs, preparava leite com ovos crus e canela. O cheiro e o gosto eram horríveis, mas tínhamos que beber. Minha irmã e eu tampávamos o nariz para beber. Era um desafio para nós, mas se não o fizéssemos, não poderíamos ir à escola ou brincar.

    Tia Maria Helena é gentil e tem um sorriso tímido de garota do campo. Ela é muito carinhosa e forte, porém se assusta com trovões e chuva forte, além de não gostar de ficar sozinha. Ama os animais, e tem vários gatos, convivendo com pelo menos quatro cachorros. Adora conversar, tirar um cochilo no sofá assistindo televisão enquanto faz carinho nos cachorros. Eu tenho a sorte de ter uma boa vida, e sou grata pela minha habilidade de ter a família unida e passar pelas dificuldades com fé, reconhece Maria Helena. Uma vida digna da ilustração de Cora Coralina: "Sou aquela mulher que fez a escalada da montanha da vida, removendo pedras e plantando flores".

    PAI E PAIS

    Pais, avôs, bisavôs ou doadores. Meu pai, seu pai, nossos pais. O homem e os homens. Pais. Um pai que está presente. Pai ausente. Pai falecido. Pai enterrado. Um pai que é lembrado e o pai esquecido. Um pai amoroso e o pai reservado. Pai irritado. Pai amigável. Pai severo. O pai que conserta tudo e o pai eletricista.

    O pai resoluto. O pai trabalhador. Pai liberal. Pai bêbado. Pai fazendeiro. Pai contador. O pai que é professor, motorista, vendedor, técnico, escritor, médico e dentista. Há tantas ocupações de outros pais que é impossível listar todas elas. O pai mais sábio e o pai ignorante. Pai educado. O pai que é a mãe. O pai tranquilo e o pai brincalhão. Pai consciente. Pai contrário, e tantos outros pais!

    Ser pai não é um trabalho fácil. Espera-se que os pais sustentem as suas famílias, demonstrem força, mas também afeto para com seus filhos e cônjuge. Diz-se que pais que têm relações de qualidade com seu cônjuge e filhos produzem filhos mais saudáveis. No entanto, muitas vezes essa não é a realidade. A base saudável da família está quebrada. Ainda assim, lutaremos, mas com resiliência e amor, superaremos as disfunções familiares. Estamos destinados a prosperar e florescer.

    Meu pai, seu pai, nossos pais.

    É o que é. Se seu pai andou com você de mãos dadas, firme, separado, nunca tocado, ou desconhecido. Há pessoas que jamais conheceram o próprio pai, o que pode ou não ter relevância na vida de cada um. Basta lembrar que estamos presentes aqui, neste momento, lendo estas palavras, e que nossa vida só existe porque nosso pai forneceu uma das células iniciais de nosso organismo, a base deste corpo físico. Essa é a realidade, é o que importa.

    Podemos ou não ter pensamentos, arrependimentos, e emoções relacionadas aos nossos pais. Ainda assim, não importa como nosso pai é ou era. Não importa porque ele nos deu o presente mais precioso: o dom da vida! O fato é que a célula inicial, que se juntou ao óvulo da mãe e criou nosso embrião, multiplicou-se e formou trilhões de células, seres humanos que somos hoje.

    Portanto, obrigada, pai, pelo dom da vida! Não apenas aos pais, mas também aos avôs, bisavôs, e todos os ancestrais da nossa família.

    O QUE VOCÊ SABE SOBRE

    OS SEUS ANCESTRAIS?

    Tomei consciência da simples e profunda realidade de que meu corpo contém o coração dos meus ancestrais. Parece óbvio, mas meu sangue é feito do deles; meu corpo carrega seus reverentes membros. Meus olhos são os portais profundos para os deles. Minha língua carrega suas palavras, canções, orações e cantos. Minha respiração conecta-me ao lugar para onde eles voltaram. O que faço com o meu corpo, faço com o dos meus ancestrais, e para o meu futuro. _Octavia Raheem

    Confesso que não sabia muito sobre minha família e ancestrais. Conheci apenas meu avô materno, Antônio Pimenta Vilas Bôas, e minha avó paterna, Mercedes Porto Neves. Eu sei que a maioria dos meus parentes de ambos os lados da família eram agricultores, viviam uma vida simples, cultivando sua própria comida e criando animais. A plantação de café era a fonte de renda mais importante. Eles também criavam vacas para vender e trocavam o leite extra ou queijo.

    A partir de 1800, é possível encontrar referências de membros da tradicional família Pimenta nos registros da igreja e do tribunal do condado. Essas pessoas podem ser alinhadas como iniciadores de diferentes ramos da família, que originaram a linhagem Pimenta, tanto de meu pai quanto de minha mãe: ambos têm Pimenta como nome sobrenome, embora não sejam parentes próximos.

    Luiz Ferreira, em seu livro São Sebastião do Paraíso – As Famílias, descreveu que, a partir de meados do século XVIII, houve um declínio no ciclo do ouro nas regiões vizinhas de Lavras, Perdões, no estado de Minas Gerais. Os moradores mais aventureiros emigraram, e começaram a adquirir terras onde criaram comunidades deram origem às cidades de São Sebastião do Paraíso, Guardinha, São Tomás de Aquino, entre outras vilas.

    Pertencentes a esse grupo de aventureiros, descendentes de portugueses, vários pioneiros pertencentes à família Pimenta Neves que migraram para a região e estão relacionados à nossa linhagem familiar foram descritos por Luiz Ferreira. Um dos pioneiros, segundo o autor, foi Angelo Pimenta Neves, que se casou com Inácia Antonia Neves em 1778 e, com ela, teve cinco filhos.

    O coronel Antônio Pimenta de Pádua, nascido no município de São Tomás de Aquino em agosto de 1847, foi outro representante e pioneiro da nossa linhagem. Ele possuía uma personalidade vigorosa com rara habilidade política; ocupou vários cargos públicos como delegado, legislador e agricultor, além de ter contribuído imensamente para o desenvolvimento da cafeicultura na região. Se você está curioso e interessado em saber mais sobre a família Pimenta Neves, a descrição detalhada pode ser encontrada no livro São Sebastião do Paraíso – As Famílias.

    Meu convite para você é que alimentemos essa curiosidade de aprender sobre nossos ancestrais.

    FIO DE FAMÍLIA. O

    QUE É ISSO?

    Embora cativante, a resposta à pergunta é complicada, porque envolve parentes, amigos amados, mentores e muitas vezes até animais de estimação.

    Considerando o fio de parentes ou ancestrais, estendemos o círculo para além da nomenclatura básica da família: avós que são pais, filhos que são sobrinhos; tias e tios que são irmãos; primos e primas de primeiro, segundo e terceiro graus. O território familiar é um fio pragmático.

    Na linha direta das gerações que nos precedem, vêm os pais de nossos avós que

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